Há uma coisa fascinante no Mad Men. É estarmos a ver uma ficção sobre pessoas que estão elas próprias a viver uma ficção. A série é sobre uma agência de publicidade nos anos 60. Mas é sobretudo sobre os costumes da altura.
Sobre as crianças brincarem com sacos de plástico na cabeça. Sobre ninguém usar cintos de segurança. Sobre as maneiras. Sobre todos fumarem e ser perfeitamente normal um pai bater no filho de outro. Sobre o papel que os homens e as mulheres julgam que têm de desempenhar na sociedade. Sobre o profundo racismo e sexismo, perfeitamente aceitável e normativo, da altura. E o que é isso senão uma ficção criada em comunidade e auto-imposta?
Isto lembra-me um livro sobre estudos de género chamado Gender Trouble em que a autora, Judith Butler, teoriza que os géneros sexuais são uma questão de “representação”. Ou seja, o homem age como homem porque interioriza que tem de “representar” aquele papel. Papel esse que tem determinadas características. A mulher a mesma coisa. Isto é claro no retrato dos anos 60. O homem bebe durante o dia e trabalha na cidade. A mulher fica em casa, nos subúrbios, a cuidar da casa e dos miúdos. O homem é o decisor de tudo. A mulher fala com cuidado para não o irritar. O homem ou esteve no exército ou esteve na universidade. Uma mulher divorciada mudar-se para um bairro novo vai desvalorizar as casas desse bairro.
Há uma auto-imposta (e socialmente imposta) representação de um papel. E se isto é verdade, não serão os costumes de todas as décadas apenas uma ficção? Sendo mais fácil observar dada a distância crítica para os anos 60, não serão os nossos costumes actuais e papéis que representamos apenas uma ficção que impomos a nós próprios e aos outros?